MARANHÃO TEM 85 MIL CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE TRABALHO INFANTIL
O Maranhão registra atualmente cerca de 85 mil crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos em situação de trabalho infantil. Os dados são do Mapa do Trabalho Infantil, divulgado em junho de 2024, com base na PNAD Contínua em parceria com o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI). O número representa aproximadamente 5% da população dessa faixa etária no estado, colocando o Maranhão como o terceiro com maior índice no Nordeste, atrás apenas do Piauí e da Bahia.
O cenário mostra uma realidade dura enfrentada por milhares de famílias maranhenses em vulnerabilidade social. Em São Luís, 59 crianças e adolescentes foram identificados em situação de trabalho apenas no primeiro semestre de 2025, conforme levantamento da Auditoria Fiscal do Trabalho, do Ministério do Trabalho e Emprego. Dentre esses, 17 tinham 11 anos ou menos. Em um dos casos, um adolescente venezuelano de 14 anos foi encontrado em situação de mendicância e fora da escola. As atividades exercidas incluíam venda de frutas e carnes em mercados públicos, comércio ambulante nas ruas, praias e semáforos, além de pedidos diretos de dinheiro nas calçadas.
Justina Maria da Conceição, de 37 anos, é uma das mães que vivem essa realidade. Sozinha, cria seis filhos e passa as noites vendendo bombons no retorno da Forquilha, em São Luís. Seu filho mais velho, de apenas 13 anos, ajuda vendendo brigadeiros no Centro Histórico da capital. Ela afirma que a decisão de permitir que ele trabalhasse não veio por escolha, mas por necessidade. Segundo ela, se tivesse um salário fixo ou apoio com os cuidados das crianças, o menino estaria em casa descansando.
Casos como esse caracterizam o que especialistas classificam como trabalho infantil urbano, proibido por lei para menores de 14 anos. A professora Maysa Moreira, do curso de Serviço Social da Estácio, afirma que o trabalho precoce em locais públicos, à noite e sem proteção social agrava os riscos e compromete o desenvolvimento da criança. Ela destaca que a infância deve ser dedicada ao estudo, ao lazer, à convivência familiar e às atividades que promovam uma formação saudável.
A professora alerta também para a naturalização e romantização do trabalho infantil, muitas vezes defendido como uma forma de formação de caráter ou prevenção ao envolvimento com a criminalidade. Ela rebate essa visão afirmando que estudos demonstram o contrário. Muitos adolescentes em conflito com a lei já exerciam atividades laborais antes de se envolverem com atos infracionais. O trabalho precoce, em vez de proteger, aumenta a vulnerabilidade e aprofunda o ciclo de exclusão social.
Dados do Ministério do Trabalho e Emprego revelam que entre 2023 e abril de 2025, 6.372 crianças e adolescentes foram retirados de situações de trabalho infantil no país. Em 2023 foram 2.564 casos, em 2024 esse número subiu para 2.741, e até abril de 2025 já haviam sido registrados 1.067 novos casos. Do total, 86% foram classificados entre as piores formas de exploração, incluindo atividades com risco físico, emocional ou ocupacional.
A maior parte dos casos envolve adolescentes de 16 e 17 anos, com 4.130 registros. No entanto, 791 crianças com menos de 13 anos também foram encontradas em atividades ilegais. Os meninos representam 74% dos casos e as meninas, 26%. As principais ocupações envolvem comércio varejista, venda de alimentos, oficinas de reparo, agricultura e pecuária. Esses setores são amplamente presentes no cotidiano de municípios maranhenses, tanto na zona urbana quanto na rural.
Outro aspecto preocupante é o trabalho doméstico infantil, comum entre meninas pobres que são acolhidas por famílias sob a promessa de abrigo e alimentação em troca de serviços domésticos. Nesses casos, elas ficam isoladas da escola, da família e da convivência social, muitas vezes expostas a abusos. Esse tipo de trabalho é classificado como uma das piores formas de exploração infantil e é proibido para menores de 18 anos.
Maysa Moreira reforça que a persistência do trabalho infantil está diretamente ligada à evasão escolar e à perpetuação da pobreza. Crianças que trabalham cedo tendem a ocupar empregos informais, com baixa remuneração e sem perspectiva de crescimento profissional. Enquanto isso, jovens de classes sociais mais altas dispõem de tempo e estrutura para investir na educação e se preparar melhor para o mercado de trabalho.
Para a especialista, o enfrentamento ao trabalho infantil não pode se limitar a campanhas pontuais. É necessário que a sociedade, o poder público, as famílias e as instituições escolares se envolvam de forma permanente, garantindo acesso à educação, proteção social e oportunidades reais de futuro. Tirar a criança da rua não é suficiente. É preciso oferecer condições dignas para que ela permaneça na escola, cresça com segurança e tenha chances reais de romper o ciclo de exclusão.
Fonte: O informante.
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